Suiza, Enero 2006 (1)
Bert
Hellinger: Como método, a Constelação da Família foi usada por outros antes de
mim. Permitiu-me realizar algumas experiências, graças a ela obtive mais
precisão sobre as relações humanas. O
uso desse método mostra que os representantes percebem imediatamente,
diretamente, o que acontece no sistema familiar sem ter recebido qualquer
informação sobre o assunto. Recebo a
informação que necessito para trabalhar observando os representantes; através
do que eles fazem se produz um movimento no sistema.
Vemos onde o
movimento se interrompe, onde ocorre um problema, como o movimento pode continuar
e chegar a uma solução. É por este motivo que no meu trabalho confio plenamente
no que os representantes expressam. A
Constelação Familiar começou de uma forma bastante superficial. O cliente
escolhia os representantes para os membros de sua família e os colocava no
espaço, relacionando-os uns aos outros. Eu perguntava aos representantes o que
eles sentiam naquele lugar e as respostas que devam me permitiram ver o que
estava acontecendo no sistema. Portanto, eu confiava nas respostas verbais
dadas pelos representantes. Confio no que se manifesta. Este é o aspecto
externo.
Pergunta: Você
fala de um campo espiritual, é uma referência às descobertas de Rupert
Sheldrake e seus campos morfogenéticos?
Bert
Hellinger: Sim, a pergunta é importante.
Rupert Sheldrake, do qual sou amigo, observou estes campos, não só nos
sistemas familiares, mas também em sistemas mais amplos. Ele participou dos
meus seminários. Me disse que tinha visto os campos morfogenéticos agirem nas
constelações familiares. Desde então Sheldrake tem continuado com suas
investigações. Ele agora fala de campos espirituais, de campos do espírito,
chamando-os de um espírito expandido, um espírito alargado. Na filosofia ocidental, em Descartes e Kant,
por exemplo, encontramos a ideia de que há uma liberdade humana e que por si mesmo
o homem reconhece o essencial e, portanto, pode agir em consequência. Essa
visão generalizada entrou em nossa cultura ocidental; faz parte da nossa
cultura.
A partir das
observações de Sheldrake e da minha, em relação à demanda por autonomia, por exemplo,
a ideia de que todos são responsáveis por seu comportamento e que ele deve ser
responsabilizado pelo que ele faz, não pode mais ser mantida. Através das constelações familiares, vê-se
que cada um está ligado a muitas outras pessoas e elementos do sistema.
Sheldrake chama isso estar em ressonância. A consequência extremamente
importante que resulta disso é que neste campo nada pode se perder. A ideia muito extensa de que poderíamos nos desfazer
de algo, até mesmo fazer algo desaparecer, vencer outro povo, por exemplo,
destruí-lo ou nos livrar de uma doença, é, portanto, aberrante. Na verdade,
essas ideias de exclusão, o fato de que seria possível nos desfazer de algo e
que já estaríamos livres disto, não pode mais ser defendida, mantida. Em um campo tudo segue presente e continua atuando
sobre todos os outros elementos do sistema, em particular os que foram excluídos
do sistema; são eles que promovem a ação mais profunda.
Vamos dar um
exemplo simples, que muitas vezes se manifesta nas constelações de família. Os
membros de um casal que anteriormente tiveram outro relacionamento conjugal. Na
nova relação eles têm filhos e de repente eles ficam surpresos com o
comportamento de um de seus filhos.
Muitas vezes, quando alguém se separa de seu parceiro, ele/ela o/a recrimina,
diz que é o/a culpado/a, e o/a parceiro/a acusado/a fica com raiva. No campo
que constitui o novo casal, o/a parceiro/a descartado/a permanece presente e
atua através do filho que manifesta os mesmos sentimentos que ele/ela
representa. Este filho não está livre, está intrincado no campo do sistema. As
consequências de uma exclusão são sempre as mesmas, o campo procura reintegrar
as pessoas excluídas através do emaranhamento com alguns descendentes.
Pergunta: Esse
sistema familiar, por exemplo, funcionaria como uma célula, um corpo orgânico
que tentaria custe o que custe manter uma forma de homeostase?
Bert
Hellinger: Muito exatamente, é uma imagem muito bonita, muito bela.
Pergunta:
Então, partindo de um problema ou desequilíbrio a Constelação familiar tem como
objetivo restaurar o equilíbrio e a harmonia?
Bert
Hellinger: Praticamente a solução consiste sempre em reintegrar a pessoa
excluída no sistema. Em seguida, a pessoa que estava intrincada (implicada ou emaranhada)
com a pessoa excluída estará livre e não será mais prejudicada pela influência
dos excluídos. No entanto, ele não está livre para fazer tudo o que ele quer,
apenas a má influência desaparece.
Essa pessoa
está então em vínculo com o campo inteiro, e em vez de excluir, o campo integra.
A pessoa então se sente completa e inteira. É nesse vínculo que a pessoa sente
liberdade. Não é uma liberdade contra alguém, mas uma liberdade que tem em
comum com os outros. Constatamos,
portanto, que nossa filosofia ocidental está superada. A realidade que
manifestam as constelações familiares mostra que esta filosofia está
incompleta, embora continue a influenciar amplamente nossa cultura.
A massa de
crítica das constelações familiares vem daqueles que pensam que devem manter a
antiga filosofia ocidental, filosofia que afirma que tal ideia é exata e que por
tanto tal outra não pode sê-lo. As
Constelações Familiares e os conhecimentos que tornaram possível descobrir não
são o fruto de uma reflexão; eles se fundamentam em observações, pois o importante
é a realidade e o reconhecimento da realidade como ela se manifesta.
Pergunta: O
que você quer dizer por intrincações? Perturbam uma ordem sutil e enérgica?
Bert
Hellinger: A intrincação é o resultado de uma desordem.
Em um sistema,
a desordem essencial é a exclusão de um de seus membros. Praticamente a solução consiste em
reintegrá-lo no sistema. Escrevi um livro chamado "As Ordens do
Amor". Nele eu mostro o que leva à desordem e como é possível restaurar a
ordem. Ordem e desordem têm a mesma dinâmica. Há desordem quando alguém se crê
ou se coloca em um lugar superior a outro, dizendo-lhe, por exemplo, "Você
não é do nosso sistema", ou seja, "Eu sou superior a você". Se olharmos então para o que se passa na
alma, o que ela diz significa: "Eu tenho o direito de viver e você
não." É muito estranho quando se
pensa nisso. A moral ou a que temos como tal até o exige, e leva à exclusão. É
por isso que aqueles que excluem os outros se sentem bem, têm boa consciência.
Consciência coletiva tenta então, sem sucesso, restaurar a integralidade do
sistema, deixando que um descendente represente inconscientemente a pessoa
excluída.
Não é possível
ajudar a esse descendente, a menos que se saiba como se produz a desordem e
como ela pode ser restaurada. A ordem é restaurada quando todos os membros do
sistema se consideram como iguais e do mesmo valor. Então a paz se instaura e é
eminentemente democrático. A democracia
como respeito pelo outro que tem o mesmo valor que eu. Uma das bases para uma vida de um casal de exitosa
entre duas pessoas diferentes é que consideram que tem o mesmo valor. Para cada
um isto consiste em reconhecer e dizer ao outro: "Preciso de você". E
ao fazê-lo os membros do casal zelam pela a harmonia entre o dar e o receber.
Quando cada um toma o que o outro lhe dá, ninguém é melhor ou menos do que o
outro. A igualdade é instaurada, uma equivalência e ordem se estabelecem.
Pergunta: Mas
se no casal uma pessoa dá mais, isso pode criar uma forma de poder?
Bert
Hellinger: Exatamente, aquele que dá mais pensa que tem mais direitos.
Muitos
terapeutas dão muito e, portanto, acreditam que têm muito poder e influência e
o cliente resiste. Quando alguém dá um
bom conselho a uma criança, a criança o segue? Geralmente não. Quando um
conselho vem de cima ninguém, nem mesmo os adultos o seguem. Quando se mostra a
uma criança como fazer certas coisas, ele pode comparar, fazer experiência. O
faz porque tem direito de fazê-lo, não para obedecer. Durante um seminário, uma participante contou
como seu filho de doze anos ainda estava fazendo xixi na cama. A mãe foi consultar
muitos terapeutas para seu filho, lhes contava o que estava acontecendo e o
filho se sentia miserável.
Aquela mãe
veio ver minha esposa. A primeira coisa que minha esposa lhe disse foi:
"Não fale sobre isso com mais ninguém". A mãe então ficou brava com
minha esposa. Uma semana depois, minha esposa recebeu uma carta daquela mãe
dizendo-lhe que a partir do dia em que lhe tinha dito para parar de falar sobre
o tema, seu filho tinha parado de fazer xixi. No campo, o menino tinha
percebido o respeito que se lhe manifestava.
Pergunta: E
como isso funciona?
Bert
Hellinger: As Constelações Familiares mostram de uma forma evidente que os
representantes percebem imediatamente o que está acontecendo no campo da
família, e que os membros da família que são representados sentem o que se passa
na constelação. É por isso que não é necessário dizer a essas pessoas o que
aconteceu, o campo se transforma por conta própria e aquela criança percebeu
que minha esposa o respeitava.
Pergunta: Estamos
então dotados de uma sensibilidade muito maior do que poderíamos pensar?
Bert
Hellinger: Exatamente. Platão já havia notado que a comunicação não é possível além
que dentro de um campo. Não poderíamos
nos comunicar, ter esta entrevista os dois, se estivéssemos isolados. Podemos
fazê-lo porque estamos em um mesmo campo. Este campo Platão o chama a alma. A
alma é o que vincula o que une.
Pergunta: A
partir de sua abordagem, muitas vezes você fala do movimento da alma. O que é isto?
Bert
Hellinger: Aristóteles fala da alma das plantas, dos animais e dos humanos. A
alma tem duas tarefas: vincula, une certas coisas, e faz uma unidade com ela.
Tudo o que está vivo está ligado pela alma. Meu corpo se mantem graças à alma.
O mesmo para um animal e uma árvore. Desta forma, a alma está em mim e, ao
mesmo tempo me supera, é mais do que eu. Sabe o que preciso, está ligada com outra
coisa. O metabolismo que conhece minhas necessidades fisiológicas só pode
funcionar porque está conectado a algo maior.
Como poderia
uma vaca encontrar a erva que a cura? A adaptação é feita porque a alma está
ligada ao todo e me integra. Nesse
sentido, há também uma alma da família, um campo do espírito. Sheldrake me
disse que um filósofo, um certo Driesch (biólogo e filósofo alemão, iniciador
de uma teoria vitalista: a filosofia do organismo) estudou essas coisas e as
chamou de "alma". Colocou então em ebulição o mundo filosófico de sua
época e para acalmar as coisas, ele substituiu o termo alma" pelo de
"campo". A alma é algo espiritual cuja atividade consiste em
unificar. Nas Constelações Famíliares, tal como eu as pratico, vemos os
movimentos da alma.
Pergunta: Para
um observador externo que olha para o trabalho das Constelações, o que emana de
conjunto pode parecer muito simples e conduz à confusão; é um método muito
simples para ser realmente eficaz ...
Bert Hellinger:
Os sucessivos desenvolvimentos que se produziram na Constelação Familiar fazem que já quase não intervenha mais do que esporadicamente.
Observo o movimento que atua através dos representantes. É sempre o mesmo: une
algo. Volta a conectar coisas que se opunham até então. Obviamente, isso tem consequências muito
saudáveis nas famílias. Podemos ver
como um casal pode se reencontrar depois de um conflito causado por intrincações
com relacionamentos anteriores ou vínculos com a família de origem. De repente, eles percebem que não estão
livres, e que em seu sistema há uma força boa que os une se eles se deixam
levar por ela. O mesmo ocorre com as
relações das crianças com seus pais. Quando as crianças são difíceis, alguns
pensam que são filhos "maus". mas, de fato, no sistema, o que eles
querem é algo bom. Não é algo no qual pensam.
Pergunta: Você está falando de doenças graves, é
também o caso de doenças crônicas?
Bert Hellinger: Especialmente para doenças
crônicas. Tivemos o caso de um rapaz que sofria de uma doença crónica na
garganta. Fiz representar a sua doença; ela estava olhando para um morto.
doença representada; ela estava olhando para um homem morto. O representante do
jovem foi dando a volta ao redor do morto. Era um movimento muito bonito. E se
tratava de uma simples dor de garganta...
Estes conhecimentos, por suposto, tem consequências para a medicina. Se se
segue o movimento de uma doença, se chegar a uma pessoa excluída esperando que
a reintegrem. Portanto, pode haver uma colaboração muito proveitosa entre
constelações familiares e medicina.
Pergunta: ao observar seu trabalho notei uma
qualidade muito particular de presença, de atenção, de escuta... e tive a
impressão de uma cerimônia se desenrolando em um espaço sagrado...
Bert Hellinger: exatamente. Quando entro nesse
trabalho, me vínculo com uma força muito maior do que eu e resulta em uma
espécie de ritual. É um espetáculo sagrado. A tragédia grega era uma
constelação familiar. Todo o público estava integrado na constelação, por tudo
o que era uma espécie de purificação. Nas tragédias, os elementos importantes
de um campo estão claramente presentes...
(1) Fonte: www.insconsfa.com “Gracias a la amabilidad de la Revista Recto-Verseau”
(1) Fonte: www.insconsfa.com “Gracias a la amabilidad de la Revista Recto-Verseau”
Traduzido do Espanhol por Marcia Paciornik
Nenhum comentário:
Postar um comentário